Caríssima parede deste quarto:
Segues teu caminho e tua doutrina, pois a minha eu mesmo crio e sigo. Odeio-te por ter que lhe falar deveras e mesmo assim permanece surda a toda esta sinfonia oca. Quanto mais falo, vejo e ouço mais vontade tenho de adentrar ao Hades em busca do desagrilhoamento eterno da excessiva faina das Danaides. Sei que é uma delas e mesmo assim nada tens de inopinada. Estás engaiolada qual um pássaro cheio de efêmeras saudades. Porventura, sentes repugnância pelo vazio? Temes os desvãos do que seja longínquo e inodoro? Por que ainda insiste em falar de amores? Não sabe o quanto me transtorna seu palavratório convicto, suas conclusões ortodoxas. Por isso peço: “queima-me com sua súcia de inquisidores! Queima-me juntamente com este Contrato Social que nos cospe e que te faz sorrir em concomitância!
Por isso continuas macilenta e fincada por sobre este assoalho postiço. Por isso ovaciona com entusiasmo qualquer verdugo astuto e benfazejo, mas, perante a ti calado permaneço. Não mereces ouvir o que tenho cá dentro. Assim sigo a vida, a sorrir internamente de tua boca enxovalhada e de tuas insípidas palavras sem nexo e em congruências, a fazer-me crer que tão somente estou no fim, que tão somente sou o fim. Não sou a ponte entre o macaco e o super-homem como dizia o brilhante Nietzsche, não sou o elo, mas o sim o fim.
Andas insistentemente como um burro de carga, com viseiras laterais, a olhar somente o que há à frente. E assim sorrio para as estrelas. Sorrio de todos os que não se deixam gritar-se a si mesmos rentes a essa planície umedecida. Sorrio de ti parede macilenta.
Anderson Costa
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